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Channel: Dr. Marcos Britto da Silva, MD, MSc Ortopedista Traumatologia Esportiva
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Tendinite Calcárea

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O que é a tendinite calcárea?
A tendinopatia calcária do ombro é uma patologia comum, caracterizada pela formação de depósitos de cálcio dentro dos tendões sadios do manguito rotador. É uma doença auto limitada e o curso natural é a absorção dos depósitos de cálcio e a cicatrização do tendão.

Qual a diferença entre tendinite calcárea e as calcificações degenerativas?
Importante diferenciar a tendinite calcária da calcificação degenerativa que ocorre nas inserções tendinosas de todo o organismo. As principais diferenças são: na tendinite calcária do ombro as calcificações ficam a um ou dois centímetros da inserção tendinosa e ocorrem em tendões sadios, geralmente com a forma arredondada. Na calcificação degenerativa os depósitos ocorrem junto a inserção dos tendões e ligamentos e tem a forma triangular e espiculada.

Qual a origem da tendinite calcárea?
Foram propostos três mecanismos para a formação dos depósitos de cálcio. calcificação degenerativa, associação com doenças endócrinas e calcificação reativa.

Teoria da Calcificação Degenerativa.
A calcificação degenerativa foi proposta por Codman, que acreditava que a degeneração do tendão precedia a formação de depósitos de cálcio. Inicialmente o tendão entraria em hipóxia e a seguir se tornaria necrótico e posteriormente ocorreria uma calcificação distrófica. Mc Laughling em 1946 descreveu a hialinização focal das fibras tendinosas; estas podem eventualmente apresentar fibrilações destacadas dos tendões, com posterior calcificação. Macnab demonstrou que a interrupção vascular no tendão de Aquiles de ratos produzia hialinização das fibras dos tendões e posterior calcificação. O trabalho de Herberts et al sugere que o esforço físico causado no ombro pelas atividades físicas pode levar a tendinite no tendão do supra-espinal. Porém, não há evidência científica que leve a conclusão de que o esforço físico pode levar a calcificação dos tendões. O trabalho de Olsson nos mostra que não existe diferença na incidência de degeneração do manguito rotador entre o membro dominante e o não dominante.
A idade é considerada a causa mais freqüente de degeneração no manguito rotador. Brewer demonstrou que à medida que o tendão do supra-espinal envelhece, sua vascularização diminui. No final da quarta e durante a quinta décadas, a maioria dos fascículos sofre afilamento e fibrilação e estas alterações são definidas como degenerativas. Brewer acredita que o envelhecimento do manguito rotador contribui para a formação dos depósitos de cálcio.
Mohr e Bilger acreditam que o processo de calcificação se inicia com a necrose dos tenócitos. Ocorre concomitantemente acúmulo intracelular de cálcio, muitas vezes em forma de microesferas ou grãos de areia. Em geral, os adeptos da teoria degenerativa da calcificação deixam de levar em consideração a distribuição etária das pessoas afetadas, o curso natural da doença e os aspectos morfológicos da calcificação. (Uhthoff e Loehr )

Existem vários aspectos sobre a tendinopatia calcária que são conflitantes com a teoria da calcificação degenerativa. A calcificação ocorre em tecido aparentemente viável e não em tecidos necróticos. O pico de incidência da tendinopatia calcária é o final da quarta década
e em toda a quinta década. A tendinopatia calcária é rara na sexta década e sétima década de vida . As doenças degenerativas não apresentam um potencial auto-limitado como observado na tendinopatia calcária. Além disso, as características macroscópicas e histológicas
da calcificação degenerativa e da tendinopatia calcária são bastante diferentes. Esses achados indicam uma etiologia diferente entre a calcificação degenerativa e a tendinopatia calcária. ( Uhthoff e Loehr)

Associação com doenças endócrinas
Harvie et al realizaram um estudo populacional no qual identificaram fatores hormonais e doenças endócrinas na patogênese da tendinopatia calcária. As patologias mais frequentemente encontradas foram desordens da tireóide e do metabolismo do estrogênio. Pacientes com doenças endócrinas em geral apresentam sintomas relacionados à tendinopatia calcária em faixa etária mais jovem: 41 anos em comparação aos 47 anos no restante da população. Além disso, neste grupo de pacientes, a história natural mais lenta: duração, em média, de 80 meses nas desordens endócrinas comparado a 47 meses no restante da população. Pacientes com desordens endócrinas necessitaram de tratamento cirúrgico mais freqüentemente. Propuseram uma classificação dividindo a tendinopatia calcária em dois grupos: Grupo I tendinopatia primária e Grupo II tendinopatia secundária a doenças endócrinas. Sugeriram a pesquisa sistemática dessas condições para ajudar na identificação de fatores prognósticos e no auxílio da indicação do tratamento cirúrgico.

Teoria da Calcificação Reativasimples
Segundo Uhthoff e Sarkar o processo de calcificação está ativamente mediado pelas células em um ambiente viável e não num ambiente necrótico. Não há a menor dúvida de que formação do depósito de cálcio deve preceder a sua reabsorção. Uhthoff propõe que a evolução da doença pode ser dividida em três fases distintas: fase pré-calcificação, fase de calcificação, e pós-calcificação. A fase de calcificação descrita por Uhthoff é semelhante às fases iniciais e tardias descritas por Lippmann em 1961. A seguir descreveremos o ciclo de formação, calcificação e reabsorção dos depósitos de cálcio, de acordo com a descrição de Uhthoff.

Fase de Pré calcificação
Na fase de pré calcificação, o local de predileção para calcificação é a fibrocartilagem que sofre uma metaplasia. A metaplasia dos tenócitos em condrócitos é acompanhada por metacromasia, indicativo da formação de proteoglicanas.

Fase de Calcificação
A fase de calcificado é subdividida em 3 fases: formação, descanso ou repouso e, finalmente, reabsorção. Durante a fase de formação, os cristais de cálcio são depositados em vesículas na matriz celular, que coalescem para formar grandes focos de calcificação. Se o paciente sofre cirurgia durante a fase de calcificação, o depósito tem a consistência de giz e o depósito pode ser retirado com uma cureta. Os focos de calcificação são separados por um septo fibrocartilaginoso e geralmente perfurados por pequenos vasos sanguíneos. Os septos fibrocartilaginosos são pobres em colágeno tipo II e são progressivamente reabsorvivos pela ampliação dos depósitos de cálcio.
Durante a fase de repouso as bordas do tecido fibrocartilaginoso são focos de calficicação. A presença de tecido não cálcico na periferia da calcificação indica que a fase de deposição de cálcio nesse local terminou.
Depois de um período variável de inatividade, a reabsorção se inicia com o aparecimento de vasos sanguíneos na periferia dos depósitos de cálcio. Logo após, os depósitos são circundados por macrófagos e células gigantes multinucleadas que removem os depósitos de cálcio. Se operamos o paciente nesta fase, a calcificação tem a aparência de uma pasta de dente espessa que freqüentemente está sob pressão.

Fase pós-calcificação.
Simultaneamente com a reabsorção do cálcio, um tecido de granulação contendo fibroblastos jovens e vasos sanguíneos começa a remodelar o espaço ocupado pela calcificação; estes locais têm a presença do colágeno tipo III. À medida que o tecido cicatricial amadurece, fibroblastos e colágeno se alinham ao longo das fibras do tendão. Durante esta fase de remodelação, o colágeno tipo III é substituído pelo colágeno tipo I. Apesar de ser possível reconstruir a patogênese do processo de calcificação através de estudos morfológicos, é difícil estabelecer quais gatilhos disparam a transformação da fibrocartilagem. Codman sugere a hipóxia tecidual como o fator etiológico inicial. Essa hipótese permanece atraente até os dias de hoje devido à peculiaridade do suprimento vascular do manguito rotador e da mecânica do ombro (Uhthoff). Uhthoff encontrou um aumento de HLA-A1 em pacientes com tendinite calcária indicando que esses pacientes podem ser mais suscetíveis a essa patologia. Os fatores que disparam o início da fase reabsortiva permanecem desconhecidos.

Qual a patologia da tendinite Calcárea?
Na tendinopatia calcária os depósitos de cálcio não estão em contato com a inserção óssea. Ao contrário, em geral eles estão a 1,0 a 2,0 cm da inserção nos tubérculos. Habitualmente, os depósitos de cálcio num determinado paciente não estão na mesma fase de evolução, porém uma das fases é predominante. Histologicamente, o aspecto morfológico de um depósito individual pode variar de um tecido fibrocartilaginoso a um tecido granulomatoso tipo corpo estranho.

Quais as fases da tendinite calcearea?

Fase Pré Calcificação
Uhthoff acredita que a patologia se inicia com a metaplasia da fibrocartilagem do tecido tendinoso. As áreas de fibrocartilagem são geralmente avasculares. A substância intercelular é metacromática e existe uma proeminência de células circundadas por halos ricos em glicosaminoglicana. Archer et al, usando anticorpos monoclonais, não encontraram a presença de colágeno tipo II. Entretanto, Uhthoff, também utilizando pesquisa com anticorpos monoclonais, identificou a presença de colágeno tipo II nesta fase.Fase de calcificação


1. Fase formativa.
Na microscopia os depósitos de cálcio aparecem em vários focos, separados por tecido fibrocartilaginoso e fibrocartilagem. A fibrocartilagem consiste de células semelhantes a condrócitos, como descrito por Archer, com uma matriz que mostra vários graus de metacromia. A aparência dos condrócitos na substância dos tendões foi documentada por vários autores desde 1912.

A ultra-estrutura desses condrócitos mostra frequentemente que as células contêm pouco citoplasma com um retículo endoplasmático bem desenvolvido, mitocôndrias em quantidade moderada, um ou mais vacúolos e numerosos processos celulares. A margem do núcleo é bocelada. As células são circundadas com uma banda de matriz pericelular com ou sem um intervalo.

O primeiro sinal de depósitos de cálcio é a presença de material granular com coloração positiva ao método de von Kossa. Esses pequenos grânulos se agrupam para formar torrões. A microscopia eletrônica de alta resolução revelou que os cristais de cálcio são mais largos que os encontrados nos cristais clássicos de hidroxiapatita e têm uma configuração diferente.

2.Fase de descanso
Durante a fase de formação a inflamação e a presença de vasos sanguíneos não são comuns, observamos outras focos rodeados por tecido tendinoso sem evidência de inflamação, essas áreas parecem corresponder a fase de repouso.

3.Fase de reabsorção
Nessa fase observamos outros focos com células mesenquimais e epiteliais leucócitos, linfócitos e ocasionalmente células gigantes. A presença dessas células é indicativa de atividade de reabsorção. A significativa reação celular ao redor dos depósitos de cálcio caracteriza o chamado granuloma cálcico, que constitui a lesão característica da tendinopatia calcária.

O aspecto granulomatoso é expressado pela presença de células gigantes multinucleadas. A reação tecidual é frequentemente acompanhada por capilares e canais vasculares finos ao redor dos depósitos de cálcio. Materiais fagocitados dentro dos macrófagos e células gigantes multinucleadas podem ser facilmente identificados.

O exame da ultra-estrutura dessas células mostra partículas de cristais eletrodensos em vacúolos citoplasmáticos, com aparência diferente dos depósitos extracelulares. Alguns acúmulos intracelulares têm forma arredondada e são conhecidos como microesferócitos ou psamonas (em forma de areia).

4.Fase pós Calcificação.
Pequenas áreas representando o processo de reparação podem ser encontradas na vizinhança das calcificações, mostrando uma considerável variação na aparência. Tecido de granulação com
fibroblastos jovens e capilares recém-formados contrastam com a cicatriz bem formada, ricamente vascular, e fibroblastos maduros que estão em processo de alinhamento com o longo eixo das fibras tendinosas.
A bursa subacromial raramente é o local primário da reação. Entretanto, devido ao volume da calcificação, o depósito de cálcio pode provocar impacto subacromial e reação (inflamação) bursal.

Como a tendinite calcárea é avaliada com exames de imagem?

Avaliação radiológica
Os depósitos de cálcio estão localizados, na maioria dos casos, no tendão do supra-espinal. As radiografias devem ser obtidas sempre que a calcificação do manguito for suspeitada. A avaliação radiográfica também é importante durante o acompanhamento da patologia, pois podemos observar facilmente a mudança na densidade e na extensão da calcificação.

As radiografias iniciais devem incluir as seguintes incidências: ântero-posterior (AP) com o braço em rotações interna, externa e neutra; perfil escapular; e axilar. Algumas vezes, angulações cranial e/ou caudal da ampola ajudam na identificação e mensuração das calcificações. As calcificações no supra-espinhal são em geral bem visualizadas no AP em neutro. Já as calcificações localizadas no infra-espinal e no redondo menor são melhor avaliadas no AP em rotação interna. A calcificação no subescapular é rara e é melhor visualizada no AP com rotação externa. A incidência axilar pode auxiliar em alguns casos. A incidência em perfil da escápula pode ajudar a determinar se a calcificação está causando uma síndrome de impacto. A radiografia simples não somente permite a confirmação da presença ou ausência da calcificação como também permite dimensionar a sua extensão, forma, e densidade.

DePalma e Kruper descreveram dois tipos radiográficos.
No tipo I, há depósitos em forma de flocos com bordas mal definidas, encontradas geralmente em pacientes com dor aguda. Durante a fase reabsortiva, que é caracterizada pela dor aguda, os depósitos de cálcio têm aparência algodoada, lembrando nuvens no céu, e são irregulares, com bordas mal definidas. A ruptura dos depósitos de cálcio na bursa somente pode ocorrer durante a fase de reabsorção, pois nessa fase o depósito tem consistência semelhante a pasta de dentes. A radiografia pode mostrar algumas vezes essa imagem como uma crescente acima do deposito de cálcio em direção a bursa subacromial.

O tipo II é caracterizado por depósitos separados bem definidos e homogêneos com densidade uniforme e bem delineados na periferia. Esse tipo é encontrado nos casos subagudos e crônicos. 52% dos casos descritos por DePalme e Kruger apresentavam uma única calcificação. Uhthoff afirma que na fase de formação, quando a dor é de pequena intensidade ou ausente, o depósito é denso, bem definido e homogêneo.
A calcificação vista na artropatia do manguito rotador tem um aspecto diferente: é pontiaguda e está na inserção óssea, sempre acompanhada das alterações degenerativas ósseas e cartilaginosos. Esses depósitos de cálcio devem ser claramente distinguidos dos depósitos reacionais intratendinosos.
Em um estudo com 217 pacientes operados submetidos a radiografias simples e ultra-sonografia, realizado por Hartig e Huth a ultra-sonografia se mostrou superior na capacidade de identificação dos depósitos de cálcio. A ultra-sonografia apresentou uma correlação de 100% dos casos confirmados com a histologia e a radiografia simples foi capaz de identificar somente 90% dos depósitos de cálcio. Apesar da ultra-sonografia não submeter o paciente a radiação o acompanhamento evolutivo da calcificação é mais facilmente realizado pela radiografia simples.

O exame de ressonância magnética é raramente utilizado. Nas imagens em T1, a calcificação aparecem como áreas de diminuição de sinal. As imagens em T2 freqüentemente mostram um halo perifocal de aumento de sinal compatível com edema.

Leia Mais no segundo artigo sobre Tendinite Calcária 2
Dr. Marcos Britto da Silva
Médico Especialista em Ombro
Botafogo, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
atualizado em 19/01/2013

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